Ícone do site Portal E21

EXCLUSIVO: Universidade de Tel Aviv: Descoberta alteração genética relacionada ao autismo

Autismo menino

Com o tempo, a compreensão do autismo evoluiu | Foto: Reprodução/Pixabay

Professor conta ao Portal E21 detalhes sobre estudo que detectou disfunção de sinapses e abriu possibilidades de tratamentos

Eugenio Goussinsky

Autismo. Ao longo do tempo, esta palavra foi adquirindo um sentido muito mais amplo do que simplesmente uma doença definitiva e excludente. Ela passou a representar importantes valores, como sensibilidade, compreensão, solidão, identidade, a busca do desenvolvimento pessoal. E detalhe. Pesquisa da Universidade de Tel Aviv identificou uma mutação de gene no cérebro que pode ser uma causa do autismo de origem genética.

Leia mais: “EXCLUSIVO: Universidade Bar-Ilan: professor desvenda a ‘fonte da juventude’”

A mutação descoberta ocorre no gene SHANK3, responsável por cerca de um milhão de casos de autismo em todo o mundo. O estudo foi liderado pelo professor Boaz Barak e pela doutoranda Inbar Fischer da Escola de Neurociências e Ciências Psicológicas da Universidade de Tel Aviv. com o professor Ben Maoz da Faculdade de Engenharia e a professora Shani Stern do Departamento de Neurobiologia da Universidade de Haifa.

“Mutações no SHANK3 podem causar autismo monogênico, ou seja, a condição surge especificamente dessa mutação, sem outros fatores genéticos contribuintes”, afirma Boaz ao Portal E21. “Essa conclusão é apoiada por extensos estudos genéticos e análises funcionais.”

Boaz descreveu de que maneira essas alterações podem ser a causa do autismo.

“As mutações no SHANK3 são normalmente identificadas por testes genéticos, como o sequenciamento de exoma completo. Essas mutações causam disfunção sináptica severa, o que se correlaciona com fenótipos específicos de autismo.”

+ Leia mais notícias de Ciência e Tecnologia no Portal E21

Na disfunção sináptica severa, que pode ocorrer por razões genéticas ou adquiridas ao longo da vida, ocorrem alterações na comunicação entre os neurônios, afetando o funcionamento normal do sistema nervoso.

“Estudos em modelos animais sugerem que tratamentos genéticos direcionados ao SHANK3 podem melhorar significativamente os sintomas, incluindo a restauração de proteínas sinápticas e a melhoria das interações entre neurônios e oligodendrócitos”, ressaltou o pesquisador. “Embora ainda não seja uma ‘cura’, tais terapias apresentam grande potencial para melhorar os resultados no autismo relacionado ao SHANK3.”

Em um cérebro saudável, as células se comunicam entre si por meio das sinapses, que são fundamentais para os processos de pensamento, aprendizado, fala e emoção. Contudo, quando o SHANK3 é danificado, essa comunicação é prejudicada, causando esta disfunção sináptica.

Isto afeta negativamente tanto o desenvolvimento quanto o funcionamento do cérebro. Indivíduos com autismo relacionado ao SHANK3 possuem sinapses defeituosas, o que interfere na rede de comunicação entre os neurônios.
Boaz destaca que a proteína gerada pelo SHANK3 tem um papel essencial na comunicação eficiente do cérebro. Ele conta que os neurônios recebem informações e os receptores são responsáveis por capturá-las e passá-las adiante para a célula seguinte.

A pesquisa se concentrou em células cerebrais chamadas oligodendrócitos, que são responsáveis pela produção da mielina — uma substância gordurosa que isola as fibras nervosas.

Boaz já disse que mielina é fundamental e a comparou a uma camada protetora dos fios elétricos em casa. A hipótese levantada é a de que o SHANK3 desempenha um papel crucial na produção de mielina, o que pode ter um impacto significativo na função cerebral.

“Embora o SHANK3 tenha sido amplamente estudado em neurônios, nossa pesquisa destaca seu papel crítico nos oligodendrócitos — células gliais responsáveis pela produção da bainha de mielina”, destaca ele. “Oligodendrócitos e neurônios formam sinapses, e sua interação é essencial para a produção de mielina. Nossa descoberta abre novos alvos terapêuticos para o autismo relacionado ao SHANK3.”

Com o tempo, a compreensão do autismo evoluiu para reconhecer que ele não é um transtorno homogêneo, mas sim um espectro, com diferentes graus de intensidade, desde formas mais leves até condições graves.

Isso permitiu uma abordagem mais inclusiva e diferenciada no diagnóstico e no tratamento. Nos anos 90, o autismo foi finalmente incluído no DSM (Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais) como um transtorno do espectro autista (TEA).

Para Boaz a ampliação da gama de diagnósticos é positiva, mas não deve ser levada à risca.

“Os critérios diagnósticos expandidos para o autismo aumentaram a conscientização e forneceram acesso ao apoio para uma gama mais ampla de indivíduos”, observa o pesquisador. “Essa inclusividade é benéfica, mas também corre o risco de diluir a precisão diagnóstica, o que poderia complicar a pesquisa direcionada e as intervenções.”

Filme marcante

O filme Meu Filho, Meu Mundo, de 1979, marcou época ao tratar do caso do menino Raun Kaufman sem preconceitos, com verdade e afeto.

Em uma época em que ainda não se tinha tanto conhecimento a respeito do espectro autista, o filme retratou a luta dos pais dele, para que a criança conseguisse desenvolver o máximo possível potencialidade intelectuais e sociais.

Raun nasceu sem sintomas, mas, ainda criança, foi adquirindo um sentido de isolamento severo.

Leia mais: “Weizmann: novo circuito genético é criado fora de uma célula, em descoberta surpreendente”

De forma comovente, os pais criaram um método, o Son-Rise, para tratamento de crianças com autismo, uma terapia criada por pais, leigos, e que obteve êxito.

O menino conseguiu criar condições para não viver aprisionado em seu mundo e encontrou caminhos para se comunicar, conversar e se relacionar.

A pesquisa relacionada ao SHANK3 ocorreu em uma etapa muito mais avançada em relação à doença. Conforme diz Boaz, hoje há métodos que têm o potencial de realizar um tratamento eficiente. Mas, independentemente da evolução científica, o carinho continua sendo fundamental.

Sair da versão mobile