No Corinthians, ele encontrou uma nova fórmula para lidar com os jogadores e colocar em prática seus conceitos
Por Eugenio Goussinsky
Quando Vanderlei Luxemburgo despontou como técnico nos anos 90, falou-se que seus métodos eram como um computador moderno superando as limitações de uma máquina de escrever, no caso, os conceitos utilizados por Zagallo e Parreira na seleção. (Foto: Cruzeiro Esporte Clube).
Para mim, a comparação era cruel e injusta, mas, sob um aspecto, ilustrava a ânsia por modernidade no futebol brasileiro.
E Luxemburgo, comandando equipes como Palmeiras e Corinthians, demonstrou isso. Armou esquemas versáteis, sabendo utilizar o melhor de cada um de seus jogadores. E os fazendo entrar em sincronia com o restante da equipe, em movimentos harmônicos, capazes de superar as mais ferrenhas retrancas.
Seus esquemas eram envolventes e já tinham muito do jogo posicional, com a amplitude do ataque pelos lados e da movimentação dos meio-campistas. Ele, inclusive, recuperou a figura do centromédio dos anos 30, 40 e 50, colocando o colombiano Rincón, elegante e combativo, na função.
Anos depois, esse tipo de jogador se tornou imprescindível na Europa, com nomes como Busquets, Modric e Rodri.
Sua modernidade estava antenada com a revolução que começava a ocorrer na Europa e que, anos depois, levaria o futebol brasileiro a um período de baixa no cenário internacional. Uma baixa que, em grande parte, foi causada pela própria desvalorização dos conceitos de Luxemburgo. Durante quase duas décadas, ele, que chegou como um visionário, passou a ser considerado decadente.
Tudo isso em função de uma precarização da mentalidade do jogador profissional. Mimados e preocupados com a própria imagem, muitos jogadores eram avessos ao protagonismo que Luxemburgo detinha nesse período e que, de forma exagerada, ele insistia em perseguir. Ganhou desafetos e intolerantes ao seu trabalho.
O técnico colecionou demissões e passagens frustrantes, interrompidas de forma abrupta e implacável, que deixava de lado todo o histórico do treinador. De herói ele passou a vilão. Coisas do futebol, que muitas vezes reflete os modismos e as incoerências da sociedade.
Foram necessárias duas décadas para que o feitiço passasse. Aqueles jogadores com os quais Luxemburgo teve dificuldades encerraram a carreira. Novas gerações surgiram, se apegando mais ao histórico do treinador do que à sua imagem arrogante.
De rejeitado, ele passou a ser admirado como um senhor que pode transmitir toda a sua experiência. E os mais veteranos, já amadureceram, deixando para trás a antipatia do passado.
No Corinthians, sua modernidade passou a ser exercida de outra maneira. Com a benevolência dos educadores atuais diante das turbulências adolescentes. Em substituição à antiga postura autoritária dos técnicos, dos professores, dos pais.
Sem o terno bem cortado que o egocentrismo levava a crer ser um fator que valorizava o técnico. Agora, com agasalho do clube. Sem a ânsia em comandar tudo, a ambição de ser manager, coach, dirigente ao mesmo tempo.
Agora, sua liderança é exercida lá do banco, nas conversas, na postura de comandante nas polêmicas no campo, chamando para si a responsabilidade de controlar os ânimos nas brigas, lutando pelos direitos dos jogadores, pela união do grupo.
Ele parece sentir prazer em ser o paizão do grupo, como se estivesse no início da carreira, sem poder errar para não se perder.
O septuagenário Luxemburgo se repaginou no comando do Corinthians. Tem o grupo nas mãos, com o domínio das movimentações em campo, substituindo com precisão, na medida certa. Poupando.
Trocando jovens por veteranos e veteranos por jovens, dependendo do momento. No ritmo da partida. Preferindo a modernidade na prática aos ditos termos modernos. O computador que parecia defasado ganhou nova versão.
Gostem ou não, Luxemburgo continua sendo uma referência. Um estímulo para que o futebol brasileiro também possa se reciclar.