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Israel e a desconstrução do terror

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Israel já negociou com o ex-terrorista Arafat | Foto: IA/Portal E21

Conversa entre Shimon Peres e Yasser Arafat resumiu a transformação do ódio em desejo de diálogo

Eugenio Goussinsky

Shimon Peres, então ministro das Relações Exteriores de Israel, conversava com Yasser Arafat, líder da Organização para a Libertação da Palestina (OLP) nos anos 1990. Ambos negociavam o Acordo de Oslo e o que era inimaginável aconteceu: Peres conversava com o outrora terrorista mais odiado em toda história de Israel até então.

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Mas Arafat não tinha mais essa feição. Estava transformado, amadurecido. Um judeu mais ortodoxo diria que Deus havia feito, naquele momento, mais um de seus milagres. O diálogo, sincero e amistoso, deu um exemplo de como os mais irreconciliáveis inimigos um dia podem conversar em paz. (Abaixo, link da música País Tropical em hebraico)

O relato foi feito por Peres ao jornalista Robert Littell, em livro sobre o político israelense. Revela não apenas um momento de sinceridade entre adversários históricos, mas m choque de visões sobre liderança, responsabilidade e legado.
Arafat, então já presidente da recém-criada Autoridade Palestina, desabafou:

“Veja o que o senhor fez comigo. Eu era uma pessoa tão popular, e o senhor me tornou um homem que provoca discórdias. Antes, todo mundo levava uma foto minha na mão e a beijava. E agora, veja quantas pessoas me criticam.”
Peres ouviu e respondeu com franqueza, fazendo um balanço histórico da liderança palestina ao longo do século:

“Durante este século, os palestinos tiveram dois líderes. Um foi o Grande Mufti de Jerusalém, Haj Amin al-Husseini, que liderou os palestinos por 43 anos. Organizou os primeiros grupos que atacaram judeus, matando mulheres e crianças. Fez o máximo que poderia fazer um líder palestino. Visitou Hitler. Era tão popular que até ordenou aos palestinos que deixassem suas casas em 1948, prometendo-lhes que voltariam depois do triunfo dos exércitos árabes. Assim, ele se tornou o primeiro responsável por transformar em problema os que poderiam ser apenas refugiados.”

O então ministro israelense continuou, dirigindo-se diretamente a Arafat.

“Depois o senhor seguiu os passos dele. Durante 21 anos utilizou as mesmas técnicas: violência, terror, tentando boicotar Israel. O senhor era extremamente popular. Mas o que foi que o senhor devolveu a seu povo?”

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Foi nesse ponto que Peres fez uma distinção clara entre prestígio e resultado.

“Agora o senhor provoca discórdias, mas veja o que tem. Tem pela primeira vez um endereço geográfico, tem uma Autoridade Palestina, tem uma posição de negociação, tem um futuro.”

E concluiu com a pergunta que atravessa gerações de líderes e revoluções.

“Então, o que é melhor? Ser controvertido e dar de comer a seu povo, ou ser popular e oferecer somente fotografias?”

Arafat sorriu. (Abaixo, link da música One, do U2)

A conversa parecia impensável anos antes dos Acordos de Oslo. Hoje, em 2025, qualquer entendimento direto com o Hamas ainda soa improvável. Israel considera a organização um grupo terrorista com o qual não há diálogo possível, especialmente depois dos ataques de 7 de outubro.

Mesmo em negociações por cessar-fogo ou troca de reféns, a mediação se dá por meio de países terceiros, como Egito, Catar ou EUA. A desconfiança israelense ainda é enorme e a retórica pública do grupo terrorista permanece hostil.

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Mas a história recente mostra que, em momentos de colapso, mesmo os mais duros inimigos podem, sob pressão, encontrar algum canal. Ainda não é o caso. A não ser que, de alguma maneira “Israel combata o Hamas como se não houvesse processo de paz e discuta a paz como se não houvesse o terrorismo do Hamas.”

Mas ainda não é o tempo de novos sorrisos.

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