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Universidade de Jerusalém: como produzir carne cultivada em larga escala

Carne cultivada Universidade Jerusalém

Custo de produção de frango cultivado pode ser reduzido | Foto: Believer Meats/Instagram

A produção tradicional de gado já está em sua capacidade máxima e os alimentos cultivados são uma solução; nenhum animal é criado, ferido ou morto no processo

Eugenio Goussinsky

A produção de carne cultivada tem sido um dos pilares da inovação tecnológica em Israel. O tema alimentação é uma prioridade. A demanda mundial por proteína animal irá dobrar até 2050, segundo a Food and Agriculture Organization (FAO), em 2024. A fome continua sendo uma ameaça. A agricultura celular, com isso, emerge como uma solução para atender essa necessidade. A produção tradicional de gado, que consome muitos recursos, já está em sua capacidade máxima.

É cada vez mais difícil aumentar o número máximo de animais suportados pela pastagem, sem causar a degradação. Segundo a Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes (Abiec), em 2023, a produção do Brasil, a maior do mundo, foi a que mais cresceu. O aumento foi de 1,7 milhão de toneladas neste período. Em segundo, estão os Estados Unidos, com aumento de 1,05 milhão de toneladas.

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A carne cultivada, neste contexto, entra como uma solução. Ainda mais pela necessidade de se mitigar a emissão de gases de efeito estufa e contribuir para a redução do aquecimento global. Além disso, também em função de questões ambientais e culturais, tem aumentado o número de consumidores vegetarianos e veganos.

Israel é um exemplo de país que tem registrado a alta no consumo destes produtos. Nenhum animal é criado, ferido ou morto neste processo.

Mas os altos custos de fábricas e de matérias-primas dificultam a viabilidade da produção de carne cultivada. Ela precisa, afinal, ser produzida em larga escala.

Na busca de uma solução, o professor Yaakov Nahmias, fundador da Believer Meats, e uma equipe multidisciplinar da Universidade Hebraica de Jerusalém (HU) publicaram um estudo na revista Nature Food.

O estudo, intitulado Produção contínua de carne cultivada: análise econômica empírica, traz um novo método contínuo de fabricação de carne cultivada. A expectativa é de uma significativa redução dos custos e na complexidade da produção, o que torna o produto mais acessível aos consumidores.

O segredo foi o uso da filtração tangencial de fluxo (TFF) para a fabricação contínua de carne cultivada. A nova montagem de biorreator permite a expansão da biomassa para 130 bilhões de células por litro. Isto significa um rendimento de 43% em peso por volume. O processo foi realizado continuamente por 20 dias, permitindo colheitas diárias de biomassa.

“Fomos inspirados pela linha de montagem automatizada de Ford que revolucionou a indústria automobilística há 110 anos”, disse o professor Nahmias. “Nossos achados mostram que a fabricação contínua permite a produção de carne cultivada a uma fração dos custos atuais, sem recorrer a modificações genéticas ou megafábricas.”

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Com base nesses dados empíricos, a equipe conduziu uma análise tecnoeconômica de uma instalação hipotética de 50 mil litros. A análise indica que o custo de produção de frango cultivado pode ser reduzido teoricamente para US$ 6,20 por libra, aproximadamente o preço do frango orgânico certificado pelo United States Department of Agriculture (USDA).

Israel como um farol

A pesquisa representa a primeira demonstração de fabricação eficiente de carne cultivada e a primeira análise econômica empírica baseada em dados sólidos.

Este esforço colaborativo envolveu engenheiros, biólogos e químicos da Universidade de Jerusalém e da Believer Meats. Financiada pela ADM, líder global em nutrição sustentável, a iniciativa está atualmente construindo a primeira instalação de produção industrial em grande escala de frango cultivado na Carolina do Norte.

“O fato de Israel ser um dos precursores do avanço da carne e gordura cultivada no mundo, tanto no âmbito da pesquisa, quanto na viabilidade comercial desta solução e da adequação das questões regulatórias no país fazem com os resultados obtidos em Israel funcionem como um farol para o desenvolvimento da carne e gordura cultivada em outros países, como é o caso do Brasil”, afirma, ao Portal E21, Tatiana Beatris Tribess, professora do curso de Engenharia de Alimentos no Instituto Mauá de Tecnologia, no Estado de São Paulo.

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Tatiana afirma que o estudo preenche lacunas cruciais, como a escalabilidade e a viabilidade econômica da produção de carne cultivada.

“A carne cultivada a um custo acessível e em grande escala, alcançando rendimentos elevados é um grande avanço para o setor”, observa a professora da Mauá. “Esse avanço elimina obstáculos técnicos e econômicos que antes limitavam a capacidade de produzir carne cultivada em quantidade e a preços competitivos com a carne tradicional.”

Um dos aspectos importantes nesta produção em larga escala é que o alimento seja saudável, nutritivo e contribua com a sustentabilidade.

“Para garantir que a carne cultivada permaneça saudável e retenha suas qualidades nutricionais, é essencial o uso de meios de cultura balanceados e que promovam o crescimento celular eficiente e estável”, acrescenta Tatiana.

“A manutenção de um ambiente de cultivo controlado, que minimize contaminações e assegure a estabilidade metabólica das células, também é muito importante.”

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