Connect with us

Mundo

Por que Netanyahu não foi à posse do presidente Lula?

Publicado

em

  • Por Eugenio Goussinsky

Na posse do ex-presidente Jair Bolsonaro, em janeiro de 2019, o governo de Israel se esforçou de tal maneira que possibilitou a vinda do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, que pela primeira e única vez até agora visitou o Brasil.

Quatro anos depois, para a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Israel não enviou um representante de alto escalão do governo, restringindo sua representação à presença do diretor-geral de Assuntos da América Latina, do Ministério das Relações Exteriores, Jonathan Peled. (crédito da imagem: Embaixada de Israel no Brasil)

A situação preocupou dirigentes de entidades judaicas no Brasil, a ponto de um deles, após afirmar que tentou com insistência trazer algum representante do governo para a posse de Lula. fazer o seguinte desabafo.

“Todas as tentativas foram sem sucesso. Não dão muita bola para o Brasil. É complicado!!!”, disse o dirigente.

O Ministro de Relações Exteriores da AP (Autoridade Palestina), Ryiad al-Maliki, compareceu à posse.

O retorno de Lula à presidência colocou, em grande parte, as relações entre Brasil e Israel sob um prisma de desconfiança.

A reportagem do portal E21, por exemplo, tentou, por duas vezes, contato com Lula, nos dois meses que antecederam a posse, após enviar mensagens que buscavam obter uma posição clara do novo governo brasileiro a respeito das relações com Israel, da questão palestina e da Paz no Oriente Médio.

Uma das mensagens foi enviada para um assessor próximo do então presidente eleito, após contato direto com o ex-ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, que indicou o funcionário.

A outra foi destinada ao Instituto Lula, para a responsável direta pelo contato com o presidente.

Este segundo pedido foi enviado pelo deputado estadual Eduardo Suplicy, um dos nomes mais influentes no Partido dos Trabalhadores, e também foi direcionado com cópia a Celso Amorim. Diz a mensagem de Suplicy para o presidente.

“Caro Presidente Luiz Inácio Lula da Silva:
Encaminho-lhe mensagem do jornalista e escritor Eugênio Goussinsky, estudioso das questões relativas ao Oriente Médio, a Israel e à Palestina, que já lhe entrevistou algumas vezes a respeito, que já trabalhou no Consulado de Israel, tem boa relação com a comunidade e entidades judaicas e considera muito positiva a relação que você sempre manteve com Israel e a Palestina. Eis porque gostaria muito de fazer uma entrevista com você sobre como nós brasileiros aqui temos inúmeras experiências de interação positiva entre israelenses e palestinos e que por isso podemos colaborar para a construção da paz entre os dois países.
O abraço amigo, Eduardo Matarazzo Suplicy”.

Nenhuma das tentativas recebeu sequer resposta.

Mudança de posição

Isso indica, se não um ato hostil, pelo menos uma grande desconfiança em relação a assuntos que envolvem o elo entre Brasil e Israel. A impressão é a de que ninguém quis se comprometer com o tema, tachando-o de um assunto delicado.

Não que isso signifique afastamento concreto, tampouco rompimento.

Mas o fato de o governo de Jair Bolsonaro, corretamente contestado por desvalorizar temas importantes, como os direitos humanos e a democracia, ter se apresentado como um aliado incondicional de Israel, tende, para muitos, a colocar o atual governo em uma posição mais distante da do governo israelense.

Ainda mais com o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, em sua retomada do poder, ter formado um governo ainda mais à direita do que já fora em outros mandatos.

Isso, inclusive, levou, três dias após a posse, o governo do Brasil a expressar “grande preocupação” com a incursão do ministro da Segurança Nacional de Israel, Itamar Ben-Gvir, da extrema direita, no Monte do Templo (ou Esplanada das Mesquitas), local sagrado para muçulmanos e judeus em Jerusalém.

A posição foi diferente daquela que se tornou padrão no governo Bolsonaro que, com algumas exceções, sempre se posicionou favoravelmente a Israel.

“Sem dúvida nenhuma vai haver uma mudança na perspectiva das relações. Já vimos um posicionamento desse novo governo na última votação na ONU, vai haver sem dúvida um impacto nesse alinhamento automático que existia no governo Bolsonaro, especialmente nos fóruns internacionais”, afirma o professor Samuel Feldberg, doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo.

O novo cenário é visto com certa insatisfação pelo governo de Israel, na opinião do professor.

“Israel obviamente vê isso como uma perda porque contava nos últimos anos sempre com o apoio quase que incondicional do Brasil, entendo que o Itamaraty vê isso como um benefício para o Brasil porque isso leva o Brasil para uma condição que eles consideram como um equilíbrio na postura internacional do País”.

Relações bilaterais

A mudança da postura brasileira, porém, não influenciou no fato de o governo israelense não ter enviado nenhum representante de alto escalão para a posse de Lula. Quem garante é o cônsul de Israel em São Paulo e região Sul do Brasil, Rafi Erdreich.

“Na quinta-feira anterior à posse do presidente Lula (ocorrida no domingo, dia 1), Benjamin Netanyahu terminava de formar o governo, não houve tempo hábil para enviar um representante de alto escalão. Mas não foi intencional, o desejo era de enviar alguém. Tanto que o primeiro-ministro enviou saudações ao novo presidente brasileiro”, observou.

Erdreich garantiu que as relações bilaterais entre os dois países irão prosseguir da mesma maneira, com acordos e programas de intercâmbio cultural e comercial, como os que o consulado tem realizado principalmente na região Sul do País.

“No âmbito do consulado, não vejo diferenças. Em relação ao governo federal, é necessário perguntar ao embaixador de Israel no Brasil”, completa. Erdreich afirmou ainda que, passada a turbulência da transição em Israel, é possível que Netanyahu ou algum representante de alto escalão do governo visite o Brasil.

“Temos que esperar, imagino que isso irá acontecer”.

Feldberg considera aceitável o argumento do cônsul.

“Eu não diria que nenhum representante do governo do alto escalão deixou de vir somente porque houve uma mudança do alinhamento do Brasil em relação a Israel. Não tenho dúvida de que Israel vai investir na tentativa de manter o Brasil simpatico às posições israelenses, com certeza vão ter que fazer também algo no alto escalão”, disse.

Além de buscar os esclarecimentos junto ao novo governo brasileiro, Suplicy afirmou ao portal E21 ser favorável à permanente tentativa de conciliação entre o governo israelense e o palestino, que se tornou o maior ponto de discórdia para os aliados de Lula. Suplicy é favorável a uma solução pacífica, com dois Estados.

“Lembro-me de evento em que participei junto com o rabino Henry Sobel, em que discorremos sobre a possibilidade de uma paz duradoura na região, que ocorrerá com a participação de todos os envolvidos, em prol de um entendimento”, completou.

Neste cenário complexo, qualquer maniqueísmo acaba caindo no vazio.

Lula mesmo já se mostrou um aliado de Israel, ao se tornar o primeiro presidente brasileiro a visitar Israel, em 2010. Na ocasião, manteve um encontro caloroso com Netanyahu (então primeiro-ministro).

Por outro lado, o governo de Jair Bolsonaro, que prometia transferir a embaixada brasileira para Jerusalém, não cumpriu a promessa, frustrando membros do governo israelense.

A missão do governo do atual presidente será a de superar as desconfianças, garantindo que elas são apenas imaginárias.

Para isso, no entanto, ele precisa se posicionar, com clareza.

Assim como Israel tem de cumprir o objetivo de enviar alguém do alto escalão para visitar o Brasil.

Só assim o dirigente, do início do texto, ficará satisfeito, por estarem “dando bola para o Brasil”.

Continue Lendo
Click para Comentar

Leave a Reply

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Mais Lidos