Em entrevista ao E21, professora da New York University conta que o partido evitou criticar a deputada Nancy Pelosi, por viagem a Taiwan
As eleições de meio de mandato ocorrerão no próximo dia 8 de novembro e os membros do Partido Democrata consideram que têm uma missão histórica: evitar que o ultraconservador Donald Trump retorne à presidência dos Estados Unidos em 2024.
Na visão da cúpula democrata, conforme afirma Barbara Weinstein, ex-presidente da American Historical Association e atualmente professora de História da América Latina e do Caribe da New York University, o importante é manter uma união, apesar de divergências internas, para evitar que Trump conquiste novamente a maioria do Partido Republicano.
Nem mesmo a polêmica ida a Taiwan, desafiando o governo chinês, da presidente da Câmara dos Representantes, a democrata Nancy Pelosi, sem a concordância explícita do presidente Joe Biden, serviu para expor qualquer tipo de divergência entre os democratas, conforme diz Weinstein.
“A tendência que tem prevalecido no Partido Democrata é não mostrar nenhuma divergência interna, neste momento o partido considera que é muito importante ficar unido, aprovando legislações apresentadas pelo governo, para ter força na disputa contra os republicanos, que estão em plena efervescência por causa de Trump”, observa.
Weinstein contou que, conforme se afirma entre os democratas, Pelosi fez questão de ir a Taiwan para manter o prestígio da comunidade taiwanesa da Califórnia, reduto eleitoral da deputada.
“É o que está se dizendo por aqui, que ela buscou mostrar força e, segundo informações não confirmadas oficialmente, agradar parte de seu eleitorado”, observa.
Ela não considera que Biden, conforme se especulou, tenha se oposto frontalmente à iniciativa de Pelosi. A visita de Pelosi serviu para aumentar as tensões entre Taiwan e a China, já que, desde 1949, após a Revolução Comunista chinesa, os derrotados da então República da China, transferiram-se para Taiwan, criando um governo local. A China considera Taiwan como parte de seu território.
“Biden não assumiu uma posição tão crítica assim, pode ter comentado algo, mas não divergiu de forma explícita. Entre os democratas, há o receio de parecer fraco na política externa, acusação em geral feita pelos republicanos. Então a posição de Biden contra a ida de Pelosi a Taiwan não ficou tão clara”, ressalta.
Pelas pesquisas, Biden está com a popularidade em queda e ameaçado de perder a maioria na Câmara dos Representantes. Basta que os republicanos conquistem algo entre cinco e dez cadeiras. No Senado, com ambos tendo 50 cadeiras (no total de 100), os republicanos precisam de apenas uma. Quem tem desempatado, seguindo a Constituição, é a vice-presidente, Kamala Harris.
Biden tem se deparado também com o aumento nos preços da gasolina e do gás, em função da proibição, por parte do governo americano, da importação de petróleo russo, como retaliação pela invasão russa à Ucrânia.
Os democratas seguidamente têm superado divergências e aprovado projetos governamentais, como o plano de recuperação durante a pandemia, com gastos de US$1,9 trilhão, que ajudaram a inflação a subir neste momento. No dia 12 de agosto último, foi aprovado um pacote de US$ 370 bilhões em programas climáticos, considerado o maior investimento da história americana.
Agenda conservadora
Para Weinstein, o extremismo de alas que buscam retomar o controle do Partido Republicano é uma ameaça aos Estados Unidos. Durante seu mandato, Trump nomeou três juízes conservadores, Neil M. Gorsuch, Brett M. Kavanaugh e Amy Coney Barrett, o gerou uma intensa guinada à direita da Suprema Corte, que passou a contar com seis juízes conservadores e três progressistas.
Abraham Lincoln era o presidente na Guerra de Secessão (1861-1865)
Em 2022, a agenda conservadora do governo Trump continuava influenciando na política, após a Suprema Corte, dentro desta guinada, ter deixado de reconhecer o aborto como um direito constitucional, após limitar restrições em relação ao porte de armas e dar a permissão para que escolas religiosas se mantenham com verbas de fundos públicos.
“O que tem se visto nos Estados Unidos é algo inédito. Nunca, nos últimos 100 anos, os republicanos se indispuseram tanto com os democratas. Acho que só na Guerra de Secessão (1861-1865, na presidência de Abraham Lincoln). (Richard) Nixon era conservador, mas tinha um projeto de governo quando, por exemplo, se aproximou da China. Reagan também. Com Trump, tudo é imprevisível, a própria aproximação com o ditador norte-coreano Kim jong-un (2018) não seguiu nenhuma diretriz planejada”.
Em mensagem a correligionários, a direção do Partido Democrata admite a preocupação com o momento. E também trabalha para, na Câmara dos Representantes, ter votos para reverter algumas decisões da Suprema Corte.
“Estamos na vanguarda dessa luta desde o início e não vamos parar agora. Este ano, estamos apoiando candidatos imparciais em disputas críticas da suprema corte estadual, como na Carolina do Norte, Ohio e Michigan, e os resultados podem afetar tudo, desde distribuição de votos até direitos de voto, direito ao aborto e muito mais”, informa o comunicado.
Weinstein acredita que a busca realizada pelo FBI (Departamento Federal de Investigação dos EUA) na residência de Trump em Mar-a-Lago, na Flórida, tem grandes chances de torná-lo inelegível, caso fique comprovado que o ex-presidente levou para casa documentos oficiais sem a devida permissão da lei.
Na busca foram encontrados vários documentos de arquivos confidenciais do governo que teriam sido alterados ou ocultados por Trump após ele deixar a presidência.
Vale lembrar que o republicano Nixon também violou a lei ao comandar um esquema de espionagem do escritório dos democratas, antes de se eleger em 1972. Ele foi eleito, mas, após investigações e julgamento, acabou renunciando em 1974. Os democratas, conforme adianta Weinstein, também estão unidos nesta luta para que ele seja impedido de participar da próxima eleição presidencial.
“Há chances dele não disputar, se o processo seguir todos os trâmites. Trump ditou a sua política de forma personalista, de acordo com seus seguidores extremistas, com atitudes sem limites, como a de levar documentos sigilosos. Sempre defendi a transparência, mas isso é violação da lei, é realmente uma ameaça à segurança nacional”, observa.
Denis Rappaport
6 de setembro de 2022 às 17:31
Excelente reportagem.
Muito obrigado por trazer esse conteúdo.