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“Não consigo sentar e deixar para lá, não importa se há bombas”, diz manifestante em Israel
Manifestações ocorreram mesmo com bombardeiros vindos de Gaza, objetivo dos protestos é pressionar Netanyahu a voltar atrás em projeto de reforma do Judiciário
– Por Eugenio Goussinsky
Na aprazível cidade de Hod HaSharon, localizada na desenvolvida planície de Sharon, em Israel, manifestantes se preparam para mais um protesto contra o projeto de reforma do governo do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu.
E, como o idealismo em Israel sempre falou mais alto, em toda a história, neste momento inédito, na última semana eles saíram às ruas mesmo durante bombardeios vindos da Faixa de Gaza, após a morte de prisioneiro palestino por causa de greve de fome. O lançamento de mísseis fez as manifestações serem canceladas pelas autoridades, como medida de segurança.(Foto: Facebook Lilach Weiss Englund).
Mas os manifestantes preferiram manter a rotina dos protestos. Uma das participantes, Lilach Weiss Englund, 47 anos, experiente designer gráfica, faz questão de levar junto a bandeira de Israel. Na última manifestação, mesmo com os bombardeios levando muitas pessoas aos bunkers, ela e seus pares preferiram ir para a rua.
“Vou a manifestações toda semana. Eu simplesmente não consigo sentar em casa e deixar para lá, não importa se há bombas. Mas estou ouvindo as recomendações internas e agindo de acordo. Por exemplo, esta noite eles pediram para não ir a Tel Aviv, então fui fazer uma manifestação em Kfar Saba. Eu pensei que, se eles recomendassem não ter nenhuma reunião, eu ficaria do lado de fora da minha casa com uma bandeira. Tenho certeza de que muitas pessoas teriam feito isso, isso causaria impacto de qualquer maneira. Portanto, acho que sou um manifestante muito dedicada, mas também cautelosa”, afirma.
As manifestações têm ocorrido semanalmente, desde janeiro, e já chegaram a reunir 500 mil no total, com a maior concentração na rua Kaplan, em Tel Aviv. Os manifestantes se posicionam por toda a estrada 2 (entre Tel Aviv e Haifa) e chegaram a protestar na frente da residência oficial de Netanyahu, em Jerusalém.
“Um momento emocionante para mim foi quando eu estava marchando junto a pessoas do sul de Tel Aviv para a manifestação. A região sul de Tel Aviv é considerada um reduto de partidários do Likud (partido de Netanyahu). Começamos em um bairro no sul com cerca de 50 pessoas e, à medida que marchamos, pessoas de outros bairros se juntaram a nós. Quando chegamos à manifestação principal, éramos cerca de 400 pessoas”, conta Lilach, que se formou na faculdade Konstfack, em Estocolmo, Suécia, um país baseado na social-democracia como Israel. Mesmo sem uma Constituição formal, o país busca o equilíbrio entre os poderes desde sua origem.
Os apoiadores que caminham ao lado de Lilach não se consideram radicais. São profissionais liberais, empresários, estudantes e professores, entre outros, que se encontram nas ruas arborizadas, repletas de amplas casas, praças e centros esportivos. Caminhando, vão se juntando a outros em cidades vizinhas, como Kfar Saba e até Tel Aviv.
“Eu realmente espero que poucas pessoas no governo eventualmente raciocinem e votem contra a reforma. Mas se não o fizerem, o país entrará em greve. Se nada ajudar, seremos uma semidemocracia como a Hungria e a Polônia. Vai ser muito triste”, afirma ela.
Entre os pontos polêmicos está a transferência para o governo de uma influência decisiva sobre a escolha de juízes. A Suprema Corte do país também não iria mais revisar leis aprovadas pelo Parlamento. O argumento dos aliados de Netanyahu é que, com as Cortes judiciais ficariam impossibilitadas de extrapolar seu poder e o equilíbrio entre o Parlamento e Justiça ficaria restaurado.
“É muito triste ver como é fácil destruir nosso incrível país que foi tão longe. Os sentimentos nas manifestações são de grande frustração e também de esperança. Ver tanta gente saindo todas as semanas juntas para lutar por valores que pareciam tão óbvios há alguns meses e já não são tão triviais. Eu acho que o mais incrível é ver 250.000 pessoas caminhando juntas em Tel Aviv e sem mostrar violência e todas elas muito bem. A frustração é ouvir nosso primeiro-ministro nos chamando de anarquistas. Mas não é essa a primeira coisa que os ditadores fazem? Culpar aqueles que se opõem a eles em vez de ter autocrítica”, desabafa Lilach.
Em função da pressão, e de greves, que contaram com a participação de médicos, advogados e profissionais da próspera indústria de tecnologia, o governo adiou a votação, no dia 27 de março. Mas continua propenso a aprovar o projeto, que só necessita de mais uma votação no Knesset (Parlamento). O momento é de angústia e também de luta, nesta onda que se colocou como o maior protesto popular da história do país.
“Se o protesto funcionar, a democracia será mais forte. Mas corremos um grande perigo, porque este governo quer mesmo mudar tudo e neste momento tem todo o poder para fazê-lo”, diz Lilach, sobre a maioria governista no Parlamento, obtida por meio de alianças de Netanyahu com partidos ortodoxos, após a quinta eleição em quatro anos, outro índice histórico no país.
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