Colunistas
O Brasil afunda com a falta de meias criativos
Eliminação para o Uruguai, na Copa América, foi um exemplo claro desta situação que tem se repetido há anos
Eugenio Goussinsky
Na ficha de cadastro de um jovem atleta, muito acima da média, o menino, que vai fazer o teste, informa que sua posição é a de meia. O avaliador, indicado por um empresário, avisa que vai enviar os dados para o clube.
Naquele mesmo dia, à noite, o Brasil foi eliminado pelo Uruguai na Copa América de 2024. Jogou um futebol melancólico. E o fato de Dorival Junior, perdido no segundo tempo, ter tirado Lucas Paquetá, que iniciou como uma espécie de terceiro volante, foi um sinal dos novos tempos.
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Paquetá não vinha fazendo grande partida, é verdade. No entanto, naquele momento em que saiu, crescia no jogo. Tornara-se meia. O Brasil tentava encontrar espaços, com um jogador a mais. Ele começava a se movimentar e dar opções. E então foi substituído.
O Brasil atual comprou uma tese absurda de que os meias acabaram no futebol. Uma classe de formadores de opinião se deu ao direito de criar essa falácia, baseados no fato de que a preparação física evoluiu. E que não há mais espaço para esse tipo de jogador criativo.
A evolução da preparação física, porém, é um falso argumento. Ela, baseada em equipamentos modernos e auxílio de nutricionistas, entre outros, até beneficia o meia-armador, hábil, técnico e inteligente, a aprimorar seu jogo. A se tornar mais forte e mais rápido em meio às novas exigências.
Nas categorias de base do Brasil, tem prevalecido um pensamento truculento, mesquinho. O garoto que domina, dá um lançamento de três dedos e não fica só correndo de um lado para o outro logo é descartado.
Tudo em função de uma postura submissa em relação aos europeus. É o complexo de vira-latas citado por Nelson Rodrigues ganhando corpo na formação de nossos jogadores. O que vimos contra o Uruguai, a ausência completa de quem pensasse o jogo, foi um sintoma de um problema que surgiu já há alguns anos.
Fica-se, a todo momento, buscando culpados pelos fracassos da seleção brasileira nas últimas Copas. E para a queda de rendimento do próprio futebol brasileiro.
Fala-se de tudo, menos sobre a verdadeira causa: a ausência de meias tem matado o futebol no país. Alimentada por essas teses modernas que louvam a combatividade e a força. É uma espécie de antropofagia, realçada por Mário de Andrade.
Temos trabalhado contra nós mesmos para imitar os europeus, que, ao longo da história, produziram bons meias, mas não na quantidade que o Brasil possui. É por isso que eles não valorizam tanto os meias. Nunca os tiveram em profusão.
Hoje, jogadores como Mendonça, Jorge Mendonça, Dicá, Aílton Lira, Tita, Pita, Gérson, só para citar uns poucos, seriam engolidos pelos “modernos” métodos de treinamento.
Treinadores odeiam os meias
Nosso futebol cai no engodo. Tenta solucionar o mal de uma maneira errada. Troca de treinador. Mas o treinador que chega também odeia meias. Falta-lhe coragem, e criatividade, para ir contra a maré.
Vemos então Bruno Guimarães, Douglas Silva e João Gomes, na função de volante, desperdiçarem seu bom futebol, quase batendo cabeça uns nos outros. Confusos na hora de criar.
Bons meias ofensivos, aliás, se transformam em atacantes geniais, como Careca e Bebeto. O último deles foi Firmino.
Com isso, podem dar ao treinador a tão sonhada polivalência. Mas no setor ofensivo. Nos últimos tempos, o termo só tem sido valorizado quanto o objetivo é o de destruir a jogada.
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O Brasil, na Copa de 1982, tinha Sócrates, Zico, Cerezo e Falcão no meio-campo. Todos meias de excelência. Entre os melhores na história do futebol. A seleção não foi derrotada por causa disso.
Pelo contrário. Encantou o mundo por causa disso. Mas a submissão em relação à própria identidade fez os críticos verem tudo ao contrário. Nosso futebol ficou “ao contrário”. Em tempo, o pequeno meia que preencheu a ficha nunca foi chamado. E daí que ele era acima da média?
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